A ausência quase total de Spielrein em obras fundamentais de história da psicanálise até a década de
1990 faz emergir várias questões. Anteriormente limitada a uma nota de rodapé escrita por Freud em Além
do princípio do prazer, e inicialmente estigmatizada como apenas uma discípula do mestre Jung, além de
ligeiramente desqualificada por ser mulher e por ter estado em intenso sofrimento psíquico, teve seus textos
publicados em destacadas revistas de psicanálise, mas isto não foi suficiente para o reconhecimento do seu
aporte conceitual à psicanálise. Tampouco do significativo lugar que ela ocupou num momento de
construção e de expansão da psicanálise.
A publicação de 'Sabina Spielrein – uma pioneira da psicanálise', livro híbrido de obras completas,
biografia intelectual e edição crítica, vem preencher a lacuna que ainda existe.
Neste primeiro volume, organizado, anotado e com textos críticos da psicanalista Renata Udler
Cromberg, encontramos alguns de seus textos fundamentais: Sobre o conteúdo psicológico de um caso de
esquizofrenia, o relato minucioso do tratamento de uma paciente atendida por ela em Burghölzli; A
destruição como origem do devir, sobre o componente de morte contido na pulsão sexual, texto que antecipa
o conceito da pulsão de morte de Freud; e A sogra, sobre filiação e a maternidade como eixos centrais da
constituição do feminino. Também uma carta de Sabina a Carl G. Jung, de 1917, expondo sua concepção do
aparelho psíquico.
O segundo volume, previsto para 2015, será composto por ensaios sobre o conhecimento do
psiquismo infantil, a origem da linguagem, o pensamento e a noção de tempo na criança: Contribuições para
o conhecimento da alma infantil (1912), A origem das palavras infantis “papai” e “mamãe” (1922),
Algumas analogias entre o pensamento da criança, o do afásico e o pensamento subconsciente (1923) e O
tempo na vida psíquica subliminar (1923) e 23 artigos curtos escritos de 1913 a 1931. O terceiro volume será
composto por três análises: da relação amorosa, amistosa e intelectual entre ela e Jung, através de
correspondência trocada entre eles em dois períodos, de 1908 a 1912 e de 1917 a 1919, da relação de
amizade e confiança profissional entre ela e Sigmund Freud, através da correspondência trocada entre 1909 a
1923 e das possíveis causas do esquecimento da importância e do pioneirismo de Sabina Spielrein na história
da psicanálise.