Não se conhece a ordem em que Shakespeare escreveu os Sonetos, nem a data em que os iniciou e terminou. Mas, dada a complexidade sintática, é pouco provável que os tenha começado antes de 1593. Na década de 1590, embora já fosse considerada uma forma ultrapassada, o Soneto ainda estava em voga entre os poetas da corte e gerava certo fascínio entre os estudantes de Direito. E os poetas que cultuavam o Soneto tinham por hábito insinuar que os mesmos continham segredos íntimos ou obscuros em seus versos. Shakespeare, embora tivesse consciência da decadência do Soneto e que este fosse frequentemente usado em brincadeiras e joguinhos enigmáticos, escreveu os seus, ao que tudo indica, para serem lidos por seus poucos e íntimos amigos, com quem tinha a liberdade de exercitar-se em um tipo de escrita que não fosse a do teatro, onde havia pouca liberdade quanto ao tempo que se gastava para produzir uma nova peça e a pressão era uma constante. Os Sonetos eram para ele, talvez, um tipo de atividade onde podia falhar, coisa que, no teatro, lhe era negada. Possivelmente, foi no decorrer da composição dos Sonetos que lhe veio a ideia de uma série e, seguindo a tendência da moda, de dar-lhe uma configuração temática, com sonetos de amor a um "Rapaz" e outros à "Dama Negra". O mito de que este Rapaz e esta Dama Negra teriam existido de fato na vida de Shakespeare só surgiu em fins do século XVIII. A mitificação deste fato, como de muitos outros da vida de Shakespeare, e a falta de documentação confiável, deixa ao pesquisador a ingrata missão de lidar com suposições, no mais das vezes fantasiosas, e como os fatos que os versos dos Sonetos pouco deixam revelar. Quanto ao pano de fundo dos poemas, os assuntos também variam de acordo com os humores e as percepções, ora falando do tempo e da natureza, ora falando do amor e da traição, ora do Rapaz ou da Dama Negra, ora da beleza, ora da morte. Mas sempre fazendo-o como um observador que tudo vê à distância e, a tudo vendo, a tudo contra