Como, e para o benefício de quem, funcionam as finanças globais? São os países ricos que enviam 'ajuda' para desenvolver os países pobres ou são os países do Terceiro Mundo que são expropriados de suas riquezas naturais e têm sua força de trabalho explorada pelos países ricos? A dívida externa dos países subdesenvolvidos é justa, ou deveria ser anulada, por já ter sido paga várias vezes?Estruturada em 50 perguntas e 50 respostas, a obra dos professores e ativistas Damien Millet e Éric Toussaint analisa os mecanismos utilizados pelos países ricos para exercer um domínio que se constitui como 'uma nova forma de colonização', praticada por intermédio das dívidas dos países em desenvolvimento e da ação das instituições multilaterais como o Fundo Monetário Internacional (FMI) e o Banco Mundial (Bird). Para os autores, a luta pela anulação da dívida do Terceiro Mundo equivale atualmente à luta travada contra a escravatura no século XIX.A partir de dados oficiais, com um texto claro e acompanhado de gráficos, tabelas e séries históricas que explicam a composição e a evolução da dívida dos países pobres, Millet e Toussaint demonstram a perversidade e a injustiça da usura global. Dos empréstimos para projetos faraônicos e dos desvios de verbas cometidos pelos governos ditatoriais, por elites corruptas e por aliados estratégicos das nações da 'Tríade' (Estados Unidos, União Europeia e Japão) ao aumento explosivo dos juros pelo Banco Central norte-americano, que esteve na raiz da crise da dívida externa do começo dos anos 1980, o livro percorre a trajetória explosiva e traiçoeira do montante devido, até o ponto em que os próprios juros da dívida se tornaram impagáveis.Os autores também demonstram os efeitos perversos dos chamados planos de ajuste estrutural (PAEs) do FMI e do Bird sobre as populações mais carentes, planos esses que forçam os países em desenvolvimento a privatizar o maior número possível de setores, a cortar gastos sociais, a abrir mercados e, com isso, a não proteger o emprego e a produção local agrícola e industrial. Tais medidas quase sempre são tomadas sob a pressão dos dois organismos, que não assumem os efeitos de suas ações e se estruturam de forma antidemocrática, como explicam os autores ao expor o sistema de decisão e a divisão de poder dentro de cada um deles, com o direito de veto reservado aos Estados Unidos.Permeado de interessantes citações de economistas, políticos e personalidades, como Joseph Stiglitz, Susan George, dom Paulo Evaristo Arns, entre outros, este livro é fundamental para entender farsas amplamente divulgadas, como o fim da importância do tema da dívida externa em países como o Brasil, ou o suposto perdão à dívida dos países mais pobres do mundo.Contra o 'consenso' fabricado e patrocinado pelo capital que se beneficia da dívida, Millet e Toussaint expõem o absurdo do peso que recai sobre os mais pobres do mundo, condenados a financiar os ricos que os exploram e a pagar eternamente uma dívida há muito tempo liquidada.