Tem gente que anda com um enorme bacalhau nas costas. A imagem é usada pela jornalista Leila Ferreira pra descrever aqueles que não conseguem se livrar da carga do mau humor e vão estragando o dia de quem tem o azar de topar-lhes o caminho. Para quem ainda não reconheceu, a autora de A arte de ser leve se inspirou no rótulo de um tônico tradicional, a Emulsão de Scott, que continha o intragável óleo de fígado, e trazia estampado um marinheiro arcado sob o peso do peixe às suas costas. O livro é um antídoto contra os “bacalhaus” que muitas vezes arrastamos pela vida afora.
A autora não pretende em nenhum momento, como a leitura revela, ser a “dona da verdade”, usar de didatismo em receitas fáceis e desgastadas dos livros de autoajuda. Também não quer as complicações acadêmicas. As histórias e impressões vão sendo aos poucos tiradas do cotidiano, da memória, das entrevistas acumuladas em sua carreira com pessoas importantes e dos bate-papos com anônimos.
Leila Ferreira tem uma capacidade singular de observação – de recolher as melhores histórias e de fazer entrevistas com o tom saboroso da conversa informal. Mas, nem por isso o livro perde na potência da pesquisa jornalística, nos dados interessantes obtidos em pesquisas recentes da psicologia, da sociologia, da medicina.
Dessa maneira, costurando informações científicas, divagando, conversando, a autora propõe uma pequena revolução: num mundo abarrotado de e-mails e telefones celulares, de pouca cortesia e muitas dietas, cheio de ambição e consumismo transformar os gestos do cotidiano, aqueles que nos prendem e sobrecarregam sem sequer nos dar a chance de percebê-los.