Em A borra do café, Mario Benedetti mescla memória e invenção e resgata as lembranças de sua infância em Montevidéu para construir uma narrativa lírica, profunda, sobre as surpresas e as dificuldades do amadurecimento. Com seu peculiar lirismo e habilidade narrativa, o autor relata pequenos acontecimentos de uma vida distante, fazendo com que o leitor reconheça a si mesmo. Na figura do jovem Claudio, o consagrado escritor uruguaio, autor de A trégua, reinventa muitas passagens marcantes de sua própria vida: as brincadeiras de rua com os amigos, as constantes mudanças de bairro com a família, a trágica morte da mãe e a descoberta do amor e do sexo. Em seu texto de apresentação do livro, a escritora Martha Medeiros destaca que toda história de infância corre o risco de parecer piegas. Mas que, no caso Benedetti, a narrativa escapa desta sina, graças ao talento do escritor. Ressalta ainda que, com mais de 80 livros publicados, a poesia comum a seus livros jamais o deixou na mão, mesmo quando não era um poema o que escrevia. “Fosse um manifesto político ou uma história contemporânea, sua emoção permaneceu desinfetada de lugares-comuns”, descreve. “E não foi diferente quando escreveu A borra do café, que conta a história de um garoto de Montevidéu que se apaixonou primeiro pela professora e depois por uma menina que ele não sabia se existia ou se era fruto da sua imaginação. Um dia, descobriu o cadáver de um mendigo, confrontando-se com a morte pela primeira vez, e logo perdeu a mãe, aos 12 anos, tendo com a morte uma intimidade ainda mais indesejável. De primeiras, segundas, terceiras vezes se faz essa ficção com jeito de biografia. Benedetti nos conduz com humor e lirismo às suas aventuras e desventuras, tenham sido elas vividas ou inventadas”, aponta a escritora em seu texto de orelha.