Na cultura da seringueira, as facas dançam. As árvores são sangradas, como animais no matadouro. Houve um tempo em que elas eram abatidas para coletar seu látex. Hoje, são tratadas como vacas leiteiras. Um talhão de seringueiras é como um rebanho de ruminantes cuja produção deve ser administrada a longo prazo. A extração do látex é uma arte ancestral herdada das populações amazônicas. Mas o látex é um produto estratégico do capitalismo globalizado. Apesar de haver borracha sintética, a borracha natural é necessária nos pneus dos automóveis, cada vez mais numerosos no planeta. Eduardo Di Deus observou seringueiros em São Paulo. Suas ações técnicas fazem parte de uma economia complexa, que vai do seringal ao mercado mundial. A qualidade do trabalho de sangria determina o uso posterior do produto. Uma vasta solidariedade técnica une o seringueiro, o operário da fábrica de pneus e o motorista. O gesto técnico também é econômico e orientado por formas sociais de organização do trabalho. Em São Paulo, os seringueiros são parceiros que trabalham com suas famílias e compartilham seus frutos com os proprietários. Aqui, como alhures, o drama social do trabalho é uma teia inextricável de cooperação e conflitos de interesse. É um livro rico e profundo que Eduardo nos oferece. Ao descrever com precisão uma comunidade de trabalhadores e suas técnicas de trabalho, ele nos fala sobre o mundo, em sua extensão espacial, bem como em sua profundidade histórica.