Há na vida momentos privilegiados, nos quais parece que o universo se ilumina, que nossa vida nos revela seu significado, que desejamos o destino mesmo que nos coube, como se nós próprios o tivéssemos escolhido. Depois o universo volta a fechar-se: tornamo-nos novamente solitários e miseráveis, tateando por um caminho escuro onde tudo se torna obstáculo aos nossos passos. A sabedoria consiste em conservar a lembrança desses momentos fugidios, em saber fazê-los reviver, em fazer deles a trama de nossa existência cotidiana e, por assim dizer, a morada habitual do nosso espírito.
Não há homem que não tenha conhecido tais momentos: mas ele logo os esquece, como um sonho frágil; pois ele se deixa capturar, quase imediatamente, por preocupações materiais ou egoísticas que não consegue mais enfrentar ou superar, porque pensa encontrar nelas o solo duro e resistente da realidade. Mas é próprio de uma grande filosofia reter e recuperar esses momentos privilegiados, mostrar como são janelas abertas sobre um mundo de luz cujo horizonte é infinito, cujas partes são todas interligadas, que é sempre oferecido ao nosso pensamento e que, sem nunca dissipar as sombras da caverna, nos ensina a reconhecer em cada uma delas o corpo luminoso do qual é a sombra.