A medicina, nos últimos dois séculos, percorreu longo e rápido percurso, desde sua afirmação como conhecimento científico, no início do século XIX. Já no século XX, com a aliança entre ciência e capital, ela passou a ser controlada e assumida pelo Estado e as empresas médicas, campo de vultosos investimentos do capital na produção de tecnologias instrumentais e de medicamentos, determinantes importantes dos avanços médicos. A prática clínica se fragmentou em especialidades. Os diagnósticos, agora precoces e preditivos, precedem o sintoma médico, debilitando o método clínico-semiológico. O trabalho propriamente médico clínico (diagnosticar, julgar, tomar decisões) torna-se mais técnico e submetido a protocolos. Em resumo, a medicina, como disciplina científica, passa a centrar seu interesse mais na doença do que no paciente. Este livro, A janela da escuta, procura resgatar e transmitir uma experiência, o resultado de um trabalho que vem se realizando há mais de duas décadas, na Medicina do Adolescente e no Núcleo de Investigação em Anorexia e Bulimia do Hospital das Clínicas da Universidade Federal de Minas Gerais. Esse trabalho expressa a defesa de uma posição clínica, um “nadar contra a corrente” na prática da medicina contemporânea. Exercita-se aí o que é essencial na clínica, a particularidade do caso e a singularidade do paciente, com o cuidado de preservar a dimensão técnica, no plano individual e social, necessária à prática da medicina contemporânea. Fica aqui um convite à leitura atenta deste A janela da escuta, na qual haverá certamente um deleite pelo agradável do texto, e quem o fizer participará de algo vivido intensamente.