O mito do lobisomem é universal. De núcleos tribais a grandes civilizações, todos já esbarraram no estranho caso do homem que vira fera.
O progresso e a tecnologia relegam esses saberes ao campo do folclore e do obscuro, mas a lua não permite à alma humana esquecer o poder oculto que se esconde e se revela em ciclos. É na fronteira entre o civil e o selvagem, Deus e o desejo, o barro e o vil metal, o espírito e a carne, a fome e o sacrifício, que vaga o lobisomem. A criatura maldita está ilustrada nos contos infantis; nas grandes capitais ou nas vilas rupestres, suas híbridas pegadas prenunciam a sombra de algo que não deveria existir. Mas existe.
À sombra da lua aponta uma chama trêmula, porém esclarecedora, sobre a encarnação do homem-lobo em terra brasilis, considerando – e até elucidando – os aspectos e os desdobramentos mais curiosos de sua estranha condição. Racionalidade e mistério se confrontam numa narrativa madura, e o resultado é uma luta de facas entre sina e paixão. A abordagem de Marcos DeBrito confere ao texto um fôlego brutal. Perspectivas mudam à maneira das fases lunares e, ao fim, o que vemos raiar do nevoeiro é um monstruoso clássico do gênero.
A literatura brasileira de horror não possuía um relato tão tétrico e macabro sobre um personagem tão comum – o que prova sua capacidade de disfarçar-se e esconder-se, a despeito do quanto esteja presente, ou até que a lua o revele. Aqui está, então, nas letras lunares de Marcos DeBrito, o causo À sombra da lua, conforme me foi outrora contado. (por Tiago Abreu, pesquisador licantropista, poeta e professor)