Alfabetizar índios em língua materna corrigiu uma distorção secular de se ensinar alguém a ler uma língua que não fala. Agora, Viviam Secin nos chama a atenção para outra questão: a diversidade visual. A leitura exige um controle binocular hiperespecializado, e a autora, que é doutora em educação e ortoptista, estudou a diversidade do olhar. Pesquisou índios de cultura predominantemente oral e universitários não indígenas de cultura predominantemente letrada. Observou que o primeiro grupo empregava mais o campo binocular periférico, enquanto o segundo usava predominantemente o campo binocular central. Essa diferença visual que impacta quem sai do mundo da oralidade para o da escrita é por muitos considerada uma deficiência, mas Viviam Secin suspeitou da interferência de fatores ambientais e culturais no processo de desenvolvimento visual. Buscou e encontrou evidências demonstrando que as condições visuais são determinadas não apenas por fatores inatos, mas pela cultura e pela história. Quem é capaz de ler a floresta tem um olhar diferente de quem foi treinado para ler livros, e vice-versa. Não há uma fisiologia binocular "normal" ou "universal", sendo as diversidades visuais diferenças culturalmente possíveis. As conclusões da autora podem contribuir decisivamente para a formulação de políticas públicas e para o planejamento de escolarização indígena e de indivíduos do meio rural, pelo desenvolvimento de estratégias de aprestamento visuais que facilitem "a transição de outros modos ecológicos de ver para o modo de ver necessário à cultura escrita". José Ribamar Bessa Freire Professor da Pós-Graduação em Memória Social da UNI-Rio e da Faculdade de Educação da UERJ. Coordenador do PROINDIO/UERJ.