Essas peças são apenas narrativas, caixas de jóias para acolher e dizer de novo o inconcebível, sob ângulos diferentes. Elas efetuam um longo percurso para melhor nomear o inominável. Oscilando entre ficção e realidade (A Morte nos Olhos), memória e realidade (A Memória Ferida), realidade e loucura (Na Outra Margem), essas narrativas múltiplas costuram o vazio da memória, interpretam de novo fragmentos de cena, concluindo percursos inacabados, preenchendo lacunas, fazendo ligações, completando o que não aconteceu. É assim que Na Outra Margem inventa uma ficção que permite encontros imaginários redentores. Esses encontros poderiam ter acontecido na realidade se as coisas tivessem sido diferentes, se não se tratasse de um destino cego e desprovido de sentido. Mas eles continuam sendo sombras. Entretanto, sua simples presença permite confissões, arrependimentos também, mas permite, sobretudo, obter a segurança de ter sido amado, único caminho de salvação que possibilita consentir em continuar a viver […].A memória é construção do passado, naturalmente, mas ela é, mais ainda, construção do presente, dizia Paul Ricoeur. Ela é o que permite melhor habitar o presente, estar no presente do passado. O presente do passado! A expressão se aplica com força às três peças aqui apresentadas. A sedução da narrativa de Antonia está bem nessa superposição do tempo, sensível no drama recontado, mas também na estrutura poli focal da peça. É o testemunho de uma consciência que chegou ao final de um longo trabalho de interiorização.´ - Josette Féral