Poucos escritores conseguem a proeza de se tornar populares fazendo literatura de altíssima qualidade. Um caso raro é o inglês Graham Greene, autor de livros já clássicos na prosa do século XX, como 'O poder e a glória', 'O cerne da questão' e este 'O americano tranqüilo'. O motivo é simples: Greene lança mão de tramas detetivescas e intrigas de espionagem internacional, mas injeta nesse gênero associado à literatura de entretenimento - o romance policial - uma dimensão profunda, que expõe questões sobre inocência e culpa, pecado e expiação, desejo e renúncia. A dimensão espiritual ou metafísica de sua literatura foi muitas vezes atribuída ao fato de o escritor ter se convertido ao catolicismo em 1926. Greene, entretanto, sempre rejeitou oepíteto de "romancista católico", empregado pela crítica como se ele fosse um religioso buscando temas literários adequados a sua crença. Ao contrário, o autor de 'Os farsantes' e 'O condenado' (ambos publicados pela Editora Globo) foi um escritor nosentido forte do termo, que procurou estar em contato com as paixões humanas naquelas situações extremas nas quais o crime e a santidade se aproximam. No caso de 'O americano tranqüilo', torna-se clara a confluência, característica de sua obra, entreenredo detetivesco, pano de fundo marcado pela conjuntura política e personagens que, envolvidas em dramas de consciência moral, são assombrados pelo fantasma do crime, essa forma radical de exorcizar os desejos. A ação do livro é ambientada duranteaGuerra da Indochina (1946-1954), na qual se enfrentaram a França (que tentava reconquistar um controle sobre o país asiático perdido durante a Segunda Guerra Mundial) e os guerrilheiros comunistas de Ho Chi Minh. O conflito é seguido de perto pelos correspondentes de guerra, dentre os quais Thomas Fowler, veterano jornalista inglês que divide o tempo ocioso entre as casas de ópio de Saigon e a amante vietnamita Phuong.