Chega em bom momento a iniciativa de Andreia Castro e Eduardo da Cruz de reunir em volume – com a colaboração, nas várias seções, de Ana Comandulli, Elizabeth Martini, Isabel Lousada, entre outros – 16 contos de 11 escritoras portuguesas do século XIX.
As antologias que até hoje circularam dão, quando muito, algum espaço a Maria Amália Vaz de Carvalho. É o caso de Contos de Oitocentos (Porto, Fronteira do Caos, 2006). Fica para alguns a falsa ideia de que, em Portugal, apenas a autora de Contos e Fantasias (1880) conseguiu transpor as enormes e variadas coerções impostas às escritoras no século XIX.
Ao Raiar da Aurora nos propõe justamente a tese oposta ao nos trazer um conjunto, sob todos os aspectos, mais rico de contistas, algumas, não nos enganemos, já notáveis nos espaços lusófonos de Oitocentos. Todas atuaram dentro dos limites impostos pelas convenções do tempo em que viveram, ultrapassando-as por vezes, nunca sem cautela. Lidas hoje, com atenção, vemos que escreveram sobretudo para o leitor do futuro. Para as apagar, muito fizeram as histórias literárias.
Lidas em bloco agora – é o convite que nos é endereçado pelos organizadores e colaboradores –, temas como os abalos no mundo do casamento, a livre escolha no campo dos afetos, os conflitos de classes (sociais e etárias) e de gêneros, os desafios da mulher que precisa trabalhar, os novos espaços de sociabilidade (urbanos e rurais), os enormes cuidados no dizer e no escrever sobre a sexualidade, tudo isso guarda as cores de uma nova linguagem ainda por decantar. E decifrar.
Sérgio Nazar David (UERJ/CNPq)