Você sabia que “Amor” é o nome oficial dado aos asteroides que orbitam entre a Terra e Marte? Te juro, é verdade, também não sabia. Descobri nas páginas que seguem. Mera coincidência? Em AsteroideAmor, as coincidências nunca são meras coincidências. E uma certeza pode servir de pista: o amor guia cada passo, pulsando na transpiração das linhas, como uma força irrefreável e onipotente.Guilherme Vasconcelos, o autor desse livro, é meio assim, tipo um meteoro do amor. Cabem elogios imensos à escrita rebuscada e humorada, falsamente despretensiosa, de ritmo ligeiro, uma forma estranhamente trivial, genuína e profunda de literatura cometida. Faz lembrar seu autor de um jeito estranhamente oblíquo e, ao mesmo tempo, muito direto.Trata-se aqui de retalhos e brevidades, descrições milimétricas e intensas, com um brilho de fundo melancólico, da vida de adolescentes suburbanos e suas desventuras por São Paulo e o ABC em 1975. Coincidência, mas não mera coincidência, neste fatídico ano, o autor tinha os mesmos 14 anos que o protagonista fictício. Dino Barbosa é um adolescente que domina a sutil arte de passar despercebido. Acompanhamos o que se segue ao desastre do seu melhor amigo, o argentino Aquiles Isidoro Lauar e sua bicicleta prateada, e como tudo se contorce com a chegada de um suposto parente torto de Dino, o eloquente, prolixo e misterioso Doutor Rosa. É o Doutor Rosa quem arrasta Dino Barbosa para investigações desenfreadas, deliciosamente confusas, perseguições escalafobéticas e hipóteses extravagantes. Se bem que talvez devamos também desconfiar do narrador do romance, conforme se enredam as investigações, sem que se possa ter certezas, embora as pistas se encaixem, até que no final… Simultaneamente, o caleidoscópio que circunda a história traz asteroides, Marte, missões espaciais em plena Guerra Fria, chimpanzés astronautas armados com pistolas soviéticas, a Revolução dos Cravos. E tudo carrega um sentido paradoxal e direto com a narrativa para que somos tragados. Também nisso vê-se muito do autor, que, ao menos em nossas deambulações, embaralha eruditismo e boemia desbragada. Outra coisa é o olhar atento para as pessoas e suas emoções loquazes, uma percepção abismal dos sentimentos e amores, esse jeito empático de sabedoria que transmuda em provocações mordazes e assombros cotidianos. Um tipo de comentário certeiro, profundo e íntimo, mas ao mesmo tempo corriqueiro, quase banal, meio deboche meio ironia. É que, dizem por aí, todas as cartas de amor são ridículas, esdrúxulas, o que não as torna menos imprescindíveis. Seja assim, ou não, atenção: esse livro não é o que parece! Talvez tudo não passe de um delírio, de um relampeio. Do brilho fugaz de um cometa, um meteoro. Um asteroide de amor. [Rafael Presto]