Quando visitou o Carandiru, o escritor Stephan Zweig ficou impressionado pelo sentido humano com que, dizia ele, era tratado o problema penitenciário, uma humanidade cientificamente desenvolvida e executada, em que a limpeza e a higiene exemplares faziam com que o presídio se transformasse em uma fábrica de trabalho. O sucesso que transformara o Carandiru em presídio modelo no mundo, até quase a metade do século XX, estava fortemente amparado na prática de diagnósticos psíquicos, calcados nos pressupostos das teorias da disponibilidade neurológica e genética, da biologia que determina o homem. Era uma prisão-laboratório que, eficientíssima, fazia com que o corpo e a mente fossem sempre objeto de atenção, fiscalização e comando. Do interior de sua eficiência, e contra ela, algumas vozes questionavam o tratamento dado aos homens. Além dos desesperados suicidas, Amleto Gino Meneghetti, o mais famoso ladrão de São Paulo no século passado, ousou revelar ao que leva o caráter pedagógico do sofrimento. Este livro mostra o porquê de o Carandiru ter-se transformado em modelo de eficiência, higiene e controle. Mas questiona se controle e habitabilidade seriam fatores de legitimidade das instituições totais. Aqui são estudados os significados da regeneração e o que ela implica para os homens e para a vida em sociedade. Só ingenuamente interessaria ter um presídio higiênico e moderno transformado em presídio governamental. A própria ideia de ser ter uma instituição total é a condutora crítica do estudo e da intervenção sobre os indivíduos.