«Durante anos, em Lovaina, em Jodoigne e, depois, em Herbais, um pouco antes do fim da tarde, a Maria Gabriela lia-me o que, nesse dia, escrevera. Escrevia quase todos os dias. Sobretudo, em Herbais, a partir de 80, onde vivíamos social e geograficamente muito isolados, essa leitura era um bálsamo e uma inquietação. Primeiro, era belo «et bien levé». Segundo, eu podia identificar o referente inicial. Terceiro, a partir daí, o texto andava por onde eu não estava, nem, provavelmente, jamais estivera. Muitas vezes, a Maria Gabriela acendia velas pela casa. Fazia-se silêncio, ainda maior do que o habitual silêncio da aldeia, cão e gatos paravam de mexer, ela lia e eu ouvia. Havia, tantas vezes, uma nostalgia tão forte, ou, mais raramente, páginas de uma negra depressão mas, quase sempre uma escrita de tal modo ampla que literatura, experiência e experimentalismo literários, a vida e o pensamento, em suma, iam ficando para longe. E, naquele país plano, não é difícil ter a noção do que é longe.» Do Posfácio de Augusto Joaquim