Há um velho postulado segundo o qual literatura não se faz com bons sentimentos. Assim é em CAVALA, livro de estréia de Sergio Tavares, vencedor do Prêmio SESC 2009 na categoria conto. Não que os personagens criados pelo autor sejam maus; porém, tomados por desvios, complexos e compulsões sexuais, cometem atos violentos — ao mesmo tempo em que buscam uma espécie de refúgio em amores, lembranças ou dores. Com segurança e domínio de veterano, o jornalista de 31 anos conseguiu superar os outros 56 concorrentes pré-selecionados na categoria, na edição mais concorrida do prêmio desde sua criação, em 2003 — foram 667 inscrições, 210 a mais que no ano passado. Nesta coletânea de quatro longos contos, situados no limiar entre a loucura e o sexo, a força das palavras escolhidas e ordenadas por Sérgio Tavares transportam o leitor a outra dimensão, como observa o jornalista Ubiratan Brasil no texto de orelha do livro: “Se fosse uma luta de boxe, seria uma sequência de golpes aplicados no fígado e no estômago até atingir o queixo”. Foi da vivência na profissão — em reportagens e entrevistas — que o autor retirou inspiração para compor as tramas e personagens das quatro densas narrativas. “Encontrei naquelas pessoas reais, cópias, simulacros, versões ficcionais de seres que padeciam do mesmo mal”, revela. Narradas em primeira pessoa, as histórias conduzem o leitor por situações onde o real e o irreal equilibram-se numa linha tênue. Assim é com o primeiro conto, que empresta o título ao livro, protagonizado por uma jovem modelo, bulímica e em surto psicótico: “Soa tão real que nos desconcerta”, descreve a escritora Heloísa Seixas. “Nesse e nos outros contos, a narrativa de Tavares tem uma beleza estranha, cruel, que nos arrasta como uma enchente”.