Rápido, escolhe uma roupa. Isso aqui é um bar. Vem. É uma estreia. Caio Riscado provavelmente não tem roupa pra isso. Mas também não vai pelado. Foi autorizado a tirar a roupa, numa página, mas não tira. Caio escolhe entre as roupas que não tem. Empresta os corpos que tem. As filhas que não teve. É ele que serve os copos, nunca cheios, nunca na mesma altura. Temos a imagem de seu peito, de seu desacerto. Conversar ele sabe (e muito bem, todo mundo sabe), mas não quer. Quer escrever. E agora você pode ler, mesmo que esteja tímida: bonitinha, (…) poesia é você me comendo/sem me olhar nos olhos. Veja: a bicha ama um problema: o problema da tradução, do amor dos homens, da falta de corpo para certos dias, da falta de intimidade das pessoas com a solidão, da esperança ser um trapézio impendurável; o problema de esquecer tudo que a gente já foi capaz de imaginar, das possibilidades estúpidas estampadas nas portas dos banheiros, dos personagens que não enfrentamos, do engano que é pensar em vencer. Aqui uma noite é uma promessa — de confusão. Chamando deus pelo nome dos outros. Caio só faz um pedido: por favor, briga comigo. E a sua briga tá comprada. A morte não me ensinou nada, então a bicha está viva. Delirando, amando, dando pinta. Com as costas cheias de futuro. O futuro vem atrás, anda junto, enquanto ele anda. O futuro é um acompanhamento. O futuro que o siga. O futuro que o veja de perto. Se entregando de bandeja, comendo a bandeja. Dormindo sozinho. A bicha é capaz de se jogar aos seus pés, mas não se engane, Caio já disse: cheguei aos seus pés/pronto/pode caminhar/daqui debaixo sou eu/quem dita as direções. Você esteja disposta. era uma vez/uma bicha/e é ainda. Essa história não acaba, porque desobedece: os anos passados são outros países e a memória é um lugar onde devemos pisar. um cigarro e a gente vai? Os bilhetes estão todos à mão. deixa a poeira baixar que a gente vai. Você esteja sem sono, porque esse bar vai durar a noite inteira, a mesa tá lotada, estamos certamente brindando, ficando malucas, não encerrando assunto nenhum. quando o socorro chegar a gente vai. Pronto, esse bar não fecha, nem as contas. No final vamos ter que acertar, dividir entre nós, o que ficou faltando. Caio já vai ter ido embora. E eu te pergunto a mesma coisa que ele pergunta na última página. Você fique com essa pergunta, quando chegar lá, e for incapaz de responder, de fechar o livro. Fique com ela daqui em diante.
maria isabel iorio