Se no palco do poder grassam, há eras, dois sólidos palanques o daquele que domina e o do que é dominado, também não é de hoje o fato de que a circulação dos que ali se inscrevem, em cena, permite que as suas posições não se revelem sempre as mesmas. No entanto, se é a vontade de potência (para si ou para o outro) que segue constituindo o rodízio desses papéis, pouco se sai de um jogo em que parece não restar enredo algum que não o de devorar ou ser devorado, querer tragar ou se ver tragado; pouco se desvia da ideia de que é no outro que se encontra o limite (a ser transposto ou fomentado) daquilo que, em nós, persevera no silêncio do potencial. Combater a vontade de potência é reconhecer espaços nos interstícios, por debaixo das máscaras, nos entredentes dessas engrenagens que a conjuntura, escamoteando, dá. Trata-se de um trabalho de busca, por outras vias, não de um giro em falso nessa roda desafortunada de uma violência contra o outro ou contra si, mas o entusiasmo de querer se haver com novos laços, novas lidas com a alteridade: um giro que desarma por aceitar-se desarmado; um giro em torno de outros e novos como por inventar, por construir, por reconhecer ou despertar nas lacunas do presente.Partindo do projeto do psicanalista Otto Gross com o escritor Franz Kafka, este livro coloca em debate, sob diferentes prismas psicanálise, filosofia, sociologia antropologia e literatura, essa paixão humana pela dominação e pela servidão e as possibilidades de combatê-la por meio desses giros que propiciem novas formas de laço.