Este volume marca a estreia de um dos maiores dramaturgos brasileiros contemporâneos na escrita de relatos breves. Para contar estas nove histórias, Ivo Bender propôs a si mesmo o desafio de criar um cenário geográfico novo, no qual a realidade está a serviço do fantástico. Assim como Italo Calvino, o escritor cria suas cidades invisíveis, lhes dá um nome, características climáticas e nos conta brevemente aquilo que elas têm de mais singular para então usá-las como pano de fundo na ambientação de suas narrativas. Esse detalhe se torna muito importante para apreciar “Campos de Santa Maria do Egito”, “Vale das Tílias”, “Sonora”, “Pedra Marcada”, “Brau Lopes”, “Espinheiros”, “Mercês”, “Aljofres” e “Corticeira”, os contos que levam o nome das localidades fictícias onde se desenrolam as histórias. Neles, a pacata realidade das pequenas cidades do interior sofre um abalo, geralmente com a chegada de alguém que vem de fora ou com a incorporação de um elemento extraordinário. Como em “Vale das Tílias”, uma pequena cidade fundada por imigrantes alemães na qual as pessoas evitam falar sobre o espírito do violonista que atravessa as ruas à noite tocando seu instrumento. O tema da imigração europeia, especialmente a alemã, também é caro ao autor, que a partir de suas lembranças da infância passada em São Leopoldo constrói as histórias dos homens e mulheres que povoaram o Sul do país. O último conto, “Corticeira”, é muito significativo neste sentido, pois conta a história de uma filha de imigrantes, Roswita, que tenta se adaptar à vida no Brasil, mas que por diversas razões carrega esse sentimento de deslocamento que parece pertencer a todos os imigrantes. Com estes nove contos – frutos da sua produção recente, com exceção de “Campos de Santa Maria do Egito”, escrito há mais de dez anos –, Bender tece um novo mapa para a geografia sulina e mostra que além de um grande dramaturgo é um habilidoso narrador.