O cinema fornece ilusão de movimento, pela projeção, em uma cadêcia suficientemente alta, de imagens fixas, gravadas em continuidade em um suporte. é a esse horizonte de expectativa sensorial que se associam peculiaridades próprias a lugares e épocas, provisoriamente definidos como sociais e históricos, além de envolver o campo da subjetividade e da imaginação, a memória e o desejo. Associam-se ainda aspectos relativos ao som e ao movimento das imagens, cujo arranjo e composição não deixam de concernir a uma sintaxe que insinua proximidade à lógica do inconsciente revelada por Freud e articulada por Lacan: deslocamentos e condensações, metonímias e de metáforas. De fato, qualquer investigação sobre a cultura visual não deixa de ser uma interrogação sobre o homem, dada a pregnância de esquemas antropológicos, míticos, psicológicos, sensoriais etc., que compreendem, cada qual, a questão da forma e de suas interpretações. Não à toa, a sintaxe do termo “ver”; coloca em jogo menos a percepção de propriedades de um objeto visível do que a solicitação de uma forma de interpretação. Por aí, e ainda que imagens fílmicas e psíquicas não se equivalham e dificilmente sejam confundidas, como ignorar que os filmes seriam espécies de sonhos concretizados? Embora o termo “falta”; não se encontre expressamente em Freud, é em seu limiar que o desejo se torna uma visível invocação feita à imagem. O que bem ilustra que a única resposta possível à realização do desejo pelo imaginário seja a de uma “figuração”; desse desejo. Então, a ideia de processo psíquico não deveria ser reservada somente às imagens psíquicas, talvez as fílmicas participem do mesmo trabalho. Afinal, é de um real que se inscrevem as “produções desejantes”;, enquanto que as criações do imaginário são necessariamente do domínio da ilusão e do irreal. Decerto, é significativamente produtivo o imaginário, e o seu trabalho não deixa de ser um esforço de conexão entre elementos disjuntos, sejam eles psíquicos ou fílmicos. Se a imagem é, portanto, um constante jogo dialético de figuração, duração e impressões, entende-se a evasão proposta: sem a recorrêcia a esse imaginário, o próprio real estaria novamente em questão, pois o desejo, longe de submeter a uma anestésica “ilusão representativa”;, desperta para essa falta onipresente, que, longe de ser armadilha destrutiva, constitui-se em uma presença essencial, sem a qual nada de criação, nada de véus e figuras artísticas, de composições linguísticas ou formação de imagens que a encobre ou a obscurece. Essa falta é, então, ausêcia com a qual passa a haver memória, imagens, letra, escritos, inclusive os que trazem uma contribuição ao que ainda continua desconhecido e instigante.