“– Abdul – chamou – , é você? Não houve resposta. Uma rajada de vento quente varreu o jardim, agitando as folhagens. Inexplicavelmente, um arrepio gelado percorreu seu corpo, fazendo-a estremecer. Algo se moveu entre os arbustos, conduzindo sua atenção naquela direção. Foi então que ela o viu.Silencioso e sério, olhava para ela de forma fixa, insistente. Os olhos claros, cintilando à luz do archote, fizeram-na cativa quando encontraram os seus. Estática, não conseguia desviar o olhar, parecendo vítima de um poderoso encantamento. Havia naqueles olhos uma força contida, um poder retido a custo. E uma experiência que estava muito além da limitada compreensão de uma jovem criada entre as paredes de um convento. Estudou, naqueles breves instantes, os ombros largos e os cabelos louros soltos ao redor do rosto sisudo. As sobrancelhas claras quase se uniam acima do nariz aquilino, em meio ao cenho franzido. Os lábios, apertados numa linha fina, pareciam numa ter sorrido. Não havia qualquer traço de benevolência, piedade ou clemência. Apesar disso, ela continuava olhando fixamente para ele, supondo que o Arcanjo Miguel teria aquele mesmo rosto e aquela mesma expressão. A mais alta potestade de Nosso Senhor, seu braço vingador, devia ter aquele mesmo olhar impiedoso e gelado enquanto erguia sua espada flamejante e espalhava a ira de Deus sobre a Terra.”