Em seu primeiro livro escrito em Berlim, onde vive desde 2007, o escritor e professor de Literatura Brasileira da USP Flavio Aguiar desafia o leitor a distinguir ficção de realidade em dezenove histórias de amor, ódio e sobrevivência. Em Crônicas do mundo ao revés - livro de contos, crônicas e 'causos' -, a ambiguidade da narrativa é anunciada logo no início: uma das condições do mundo ao revés é não levar a sério demais quem narra, avisa o autor. 'Somos bombardeados continuamente por imagens e mensagens sobre cuja idoneidade e veracidade não temos a menor ideia. Isso não nos impede, no entanto, de fazer escolhas nem de sair de uma história para entrar em outra', afirma.Exercendo liberdade total de expressão, Aguiar constrói múltiplos narradores que não se guiam pelo ideal do politicamente correto. Cada história é um fragmento de estilo, e o conjunto forma uma unidade tão controversa quanto a própria identidade do ser humano. Dividida em quatro partes ('Tempos difíceis', 'Palavras difíceis', 'Causos difíceis' e 'Histórias difíceis'), a obra trata de uma variedade de temas que vão da história familiar do autor aos tempos da ditadura militar e suas cicatrizes na vida brasileira. 'O livro se pauta pelo bom humor e pela ironia de seus narradores, mesmo ao enfrentar histórias trágicas, como muitas do golpe de 1964 e suas consequências. É um olhar irônico e distanciado que viaja também à infância e às pequenas histórias ocultas dos grandes segredos familiares', diz o autor.Como o autor ressalta numa 'Advertência' inicial, o mundo ao revés é aquele onde se registra o impossível de acontecer - mas que, no entanto, acontece. Todas as histórias são permeadas por uma fina ironia, como a do militante da luta armada contra a ditadura no Cone Sul que se agarra à vida e sobrevive à prisão, mas não a supera, pelo contrário, alimenta pensamentos suicidas em seu retorno. O livro conta com apresentação da psicanalista Maria Rita Kehl e texto de orelha do escritor Roniwalter Jatobá.