Das “técnicas” de fazer desaparecer corpos é o resultado de um estudo socioantropológico que descreve e analisa as relações entre sofrimento, violência e política, a partir da experiência e da perspectiva dos familiares de vítimas de violência. Focaliza-se uma modalidade específica de casos e situações: o desaparecimento forçado de pessoas, e, portanto, a violação e a ausência dos corpos. Por meio das narrativas dos familiares dos desaparecidos, é possível acessar certas gramáticas morais e políticas em que categorias e temas como desaparecimento, desaparecido, vítima, familiar de vítima, morte violenta, favela, violência policial/estatal, milícia, “traficantes”, terror, luto, justiça, ação coletiva e espaço público emergem no processo de construção de uma teia de significados e sentidos.Embora não seja possível definir a magnitude do fenômeno do desaparecimento forçado, é admissível sugerir que, atualmente, ele corresponde a um dispositivo de governo-gestão e que, no plano dos perpetradores, há um campo de continuidades que envolve polícia/milícia/“traficantes”. Além disso, há um universo de vítimas possíveis que têm em comum sua vulnerabilidade a esse dispositivo de governo-gestão, pela combinação de variáveis como território, condição social, atividade e/ou suspeição. E o ato de fazer desaparecer corpos – enquanto prática-evento – fornece um denominador comum para atores que geralmente são colocados como distintos ou mesmo antagônicos. Esses atores se movimentam ora colaborativamente, ora em disputa, mas compartilham certas doxas comum, como a “característica” de que algumas pessoas sejam desaparecidas/“desaparecíveis”.