Depois Será Tarde adverte: a morte está aí nos seus calcanhares. Nestes 15 contos perturbadores, Luciana Annunziata capta o instante em que a vida cotidiana, acossada pela entropia implacável, descamba pelas pirambeiras da Ceifadora. “A vida é sempre um processo de demolição, mas os golpes que fazem a parte dramática do trabalho não mostram de imediato todo efeito. Há um tipo de golpe que vem de dentro, e não o sentimos até ser tarde demais: sua percepção vem de um momento para o outro”, falou, mais ou menos assim, Scott Fitzgerald. É o golpe pressentido em “A estação das moscas”, em que a narradora, abandonada aos poucos pelo marido, que prefere a companhia de literatura russa, passa os dias trepada numa mangueira. Sentimos esse golpe em “Algo sobre as plantas”, quando o protagonista só se aproxima do pai pela ausência. O golpe vem também em “Onde dormem as mariposas”, em que se desvenda outro tema de Annunziata: a metamorfose – o flagrante do momento em que uma coisa deixa de ser uma coisa para se tornar outra, mas ainda se mantendo a primeira. Nessas estranhas histórias, a morte pode se camuflar de libido – e a sensualidade atravessa muitas narrativas – , como defesa, e também como revelação. É o caso do bizarro “O último macho hétero”, em que a narradora se envolve com um sujeito que coleciona esquisitos troféus de sua masculinidade (frágil). O instante em que a morte se intromete na vida é flagrado em espaços confinados, do congelador à fazenda, passando por apartamentos e condomínios. A morte se sente tanto nos embates psicológicos quanto nos sociais – da incomunicabilidade entre indivíduos ao choque entre classes. E, embora paire por estas narrativas muito originais uma ameaça de terror, a escrita é embalada em ironia fina, no humor da dark comedy. Proteja-se que lá vem golpe: depois não diga que não avisei.