Uma mulher – assim mesmo, sem nome, como todos os personagens deste livro – frequenta uma igreja evangélica instalada numa garagem, com cadeiras cor de laranja. O pastor, como a casa que dirige, é um homem pobre, de hábitos simples e sem grandes perspectivas. Entre o pastor e a mulher surge uma troca de olhares estranhos aos dois, mas não podem levar essa troca adiante porque Deus não aceita. Adultério é pecado, e o pastor, logo ele, não pode ser a causa do esfacelamento de uma família aparentemente feliz, com um marido sempre de bom humor e dois filhos que são só alegria. Mas, desprovida de amor e tendo perdido a fé, a mulher se transforma numa ovelha desgarrada, sem saber o que fazer para recuperar-se. Então passa a errar de templo em templo, seja ele evangélico ou católico, à procura de uma resposta para as suas indagações, menos dolorosas que a solidão em que vive. Com uma linguagem toda feita não de frases, mas de fragmentos de frases, o que gera uma tensão incomum à narrativa e fazendo das emoções mais íntimas um fogaréu capaz de chamuscar a alma por inteiro, este romance escrito com originalidade e maestria por Eda Nagayama trata, entre outros temas difíceis, da dificuldade de aproximação entre seres tementes a Deus. É isso, no fim, o que Eda procura mostrar através de seus personagens anônimos que não se contentam com apenas nascer, viver, morrer. Que ninguém pense, no entanto, que esse universo de interdições não tem solução. Às vezes, uma frase simples mas poderosa pode abrir uma brecha para outra realidade. Antonio Carlos Viana