Hoje estou bem, mas teve uma época da minha vida que eu me perdi de mim, vivi minha morte pessoal, foi do caralho. Hoje moro sozinho, não estou com ninguém; então, quando chega o final de semana, fico em casa escrevendo sobre a minha vida nas páginas dos meus livros. Queria te falar da minha demência por ter vivido o que eu vivi: conheci profundamente a depressão, ficava em casa o dia inteiro sozinho, nessa época eu era casado, minha mulher e minha filha saíam pra trabalhar, e lá estava eu... sozinho. Eu passei a morar na sala, ela virou meu mausoléu particular, era eu, a sala e as paredes, cara, as paredes ficavam preocupadas comigo, elas nunca sabiam o que eu ia vociferar, elas tinham medo de mim... eu tinha medo de mim. Nunca vou conseguir explicar o que eu estava sentindo, era um misto de nada com coisa nenhuma, um vazio tão profundo, eu... eu dei significado à palavra nada, eu fui o vazio. Nos dias atuais, passado pouco mais de três anos daquela loucura, eu ainda não sei direito o que aconteceu comigo, não sei como a depressão chegou, tampouco como ela foi embora, vivi dois anos de um abandono pessoal muito profundo. Sabe, eu ficava dez, doze, quinze dias sem tomar banho, eu mentia pra todo mundo, menti tanto que as mentiras passaram a ser a minha verdade, eu vivia jogado no chão da minha sala, abandonei minha mulher e minha filha, elas estavam tão perdidas. Eram dias e dias de apenas um bom-dia e um boa-noite, nada mais eu falava com elas, eu vivenciei o silêncio, ficava dias sem falar com ninguém... você quer saber como aquela loucura acabou? Eu não sei. Minha mulher me deixou, não suportou me ver daquele jeito, um dia ela saiu e não voltou nunca mais, me mandou uma mensagem cinco dias depois me falando que não ia voltar, terminou nosso casamento de vinte e sete anos em uma mensagem, não consigo imaginar o tamanho da sua dor pra não ter coragem de olhar nos meus olhos e me falar o que tinha vontade. Só sei que um dia acordei, levantei, fiz a barba, tomei banho e fui procurar emprego, minhas paredes nunca mais tiveram medo de mim. Morri tantas mortes... Decidi viver
Vivi tantas vidas... Decidi sonhar
Sonhei tantos sonhos... Decidi voar
Voei tantos voos... Decidi ser o meu destino
E ASSIM EU SOBREVIVI AO MEU MAIOR INIMIGO... EU!