Por Virna Teixeira
Diante de um momento coletivo tão desolador, Flavia Rocha consegue uma proeza. Escrever a desolação. O testemunho de Exosfera é de um astronauta, cujo gênero desconhecemos, que se afasta e observa a Terra, em 2121, “um ano sem semblante próprio”.
Nesta “massa pisoteada de eventos”, reflete sobre a destruição da Diversidade Botânica Evolutiva, na missão de catalogar detritos, com a experiência ampliada na exosfera do recolhimento. O olhar como uma câmera, ora como um drone, ora como um arquivo visual, paira sobre imagens atuais e antigas. Incêndios, espécies em extinção, um casal abraçado a um bote salva-vidas, os ancestrais que um dia viveram perto de uma mata dormente.
Como regressar, como estabelecer um distante contato, entre neutralidades de falsa frieza? “Por que tanta dificuldade em falar de amor?” Neste percurso de longa espera, a atitude mais sábia parece ser escolher os galhos dos ramos quase extintos. Agarrar-se aos dias que restam.
Praticar o desapego, dentro desta cápsula. Pois “não é humano viver assim”, nesta liberdade oca, contra a falta de oxigênio.
Para vencer esta asfixia precisamos mais do que nunca da poesia, da arte. Para arejar a exaustão coletiva de tantas perdas. E retornar neste hiato do que está para acontecer, na saída deste longo vácuo.