Autoficcional, experimental e metaliterário, Explosão é um romance insólito nascido das viagens de Hubert Fichte ao Brasil. Autor de interesses diversificados, Fichte concentra-se sobretudo nas perscrutações acerca das culturas africanas e afrodiaspóricas, chegando às terras brasileiras para pesquisar, por meio de uma etnografia subjetiva, religiões sincréticas afrobrasileiras. Sendo ele mesmo homossexual, vive, observa e relata também o universo gay, ainda muito marginalizado nos anos 1970 e 1980. Jäcki e Irma, os protagonistas, constituem projeções autoficcionais do próprio Fichte e de sua companheira, a fotógrafa Leonore Mau. Viajando pelo Rio de Janeiro, Salvador, São Luís do Maranhão e outras localidades ao norte e nordeste do país, os dois descobrem, a partir do ponto de vista da vivência subjetiva, a riqueza das religiões afrobrasileiras, travam conhecimento com pais e mães de santo, mergulham na cosmologia do candomblé e da umbanda, e participam de rituais diversos. Em meio a essas investigações etnoreligiosas, Jäcki narra suas vivências e encontros sexuais com homens e suas perambulações por zonas de prostituição homossexual, em descrições vívidas e pungentes, bem como as perseguições policiais e violências de toda a sorte cometidas contra gays e travestis no Brasil da ditadura militar e da redemocratização. Entre carnavais, prostíbulos, oferendas aos orixás, índices de violência e desemprego, Jäcki encontra também nomes célebres da intelectualidade ativos no Brasil e na América do Sul de seu tempo, como Pierre Verger, Oscar Niemayer, Jorge Luis Borges e Salvador Allende, todos relatados ao longo do seu processo de narrar e autonarrar. A partir desse ponto de vista que entremeia literatura, etnologia, antropologia, relato de viagem e autobiografia, Fichte cria uma estrutura narrativa que foge completamente às formas tradicionais, oferecendo ao leitor um texto original, repleto de imagens de incrível força poética em meio a colagens de notícias de jornal que pontuam a situação política e social do Brasil da época. A etnografia subjetiva de Explosão, traduzida aqui pela primeira vez ao português por Marcelo Backes, é um compêndio incômodo, visceral e lírico. Um retrato lúcido, original e fascinante de um escritor narrador de si mesmo em busca da experimentação narrativa do vivido.