Escrevendo sobre Mallarmé, Valéry levanta uma questão de interesse para qualquer aproximação à criação poética - a relação entre esta criação e as origens mais remotas das funções da linguagem humana. Em todo o poema bem realizado, o leitor há de sentir a palavra como se ela surgisse para uma nomeação originária, transformando o que se nomeia em algo novo por força da própria nomeação, conferindo ao poeta características de um oficiante de ritual em que dominassem os poderes da memória (pela recuperação das fontes da linguagem) e da magia - pela criação de uma nova realidade que é a poética. O leitor, lendo este livro, é convidado a se deixar envolver por tudo o que é reverberação de som e imagem, abdicando da objetividade e mergulhando no tumulto das sensações gravadas na pele das palavras. Em todos os poemas, extraídos de três livros publicados entre 1992 e 2001 (Sutra, Yumê e A Sombra do Leopardo) e do inédito Pequenas Aniquilações , passa uma inquietação que, sendo o registro daquele jogo de encantamento referido, mantém os textos nos tensos limites do indizível. Por onde são convocados todos os valores sensíveis da linguagem mas, atenção! sob o controle estrito de uma consciência acesa pelos valores da história, seja a circunstancial, seja a da própria linguagem da poesia.