A partir de análise de fontes primárias ricas e inéditas (sobretudo processos judiciais), Thiago Hoshino – professor de Direito na UFPR e pesquisador fino e cuidadoso, com alma de artesão – tem o mérito de “desvelar” ao/à leitor/a tantas coisas. Enumero algumas: a primeira, a de dar voz, certamente de modo até aqui nunca feito, a certos atores da cena histórica do século XIX que não tiveram voz nas suas próprias existências e em seu próprio tempo; com isso, é um trabalho de resgate de uma perspectiva histórica “a partir de baixo”, com foco naqueles – os escravizados – que sempre foram subalternizados tanto em suas épocas como também na leitura de certa historiografia, tendo o mérito de focalizar em temas sensíveis (inclusive ao nosso presente) como cidadania e os direitos daqueles que são carentes de direitos. Segundo, a de realizar, no plano metodológico, uma análise “micro” que sabe caminhar com e para o “macro”; ou seja, tomar a concretude de vivências e evidências que os processos judiciais do período exalam não para meramente cultivar o pitoresco, mas para contribuir com a compreensão de um contexto histórico mais amplo, do qual certamente o caso de Curitiba (foco principal do trabalho) era representativo dentre tantos rincões do cenário do Brasil Império. Terceiro, a de contribuir, desde o fértil caldeirão curitibano de produção histórico-jurídica, com um trabalho modelo (na metodologia, nos marcos teóricos, na escolha e na utilização das fontes) para quem quer saber mais sobre história do direito oitocentista e sobre temas como escravidão, ações de liberdade e luta pela igualdade. Certamente há tantas outras nuances e descobertas neste rico livro que o/a leitor/a haverá de desvelar. Obra imprescindível, seja para juristas e historiadores, mas também para quem quer compreender melhor algumas de nossas raízes que por tanto tempo foram escondidas (e ainda são), e de modo nunca inocente, em gavetas fechadas da nossa memória coletiva.
Ricardo Marcelo Fonseca
Prof