Da impossibilidade de afirmar-se enquanto totalidade e, simultaneamente, da vigorosa recusa de ver-se enquanto unidade, o sujeito hoje rascunha identidade por operações fecundas. No entanto, em tempos de sucessivos golpes, os processos de gênero que se desenham são perspectivados com traços que parecem nos escapar. Fracassos históricos que ora dependiam de revoluções para formar simetrias, parecem nos colocar agora diante do seguinte exercício: gênero pela categoria do expandido pressupõe gestos ininterruptos. Se processos hegemônicos se apoiaram fortuitamente em nós mesmas/os até o presente para se legitimarem e se o vocábulo crise já não desperta modos transformativos das opressões, são as insurreições artísticas que convocamos na presente obra para tratar de gênero. Recusar-se a ontologizar a prática de ver-se e ver a/o outra/o no social tira da zona de conforto até mesmo estratégias sociais harmonizadoras. A tensão com a qual trabalhamos aqui tem na ação do imaginário sensível e no inventário poético a força para desmentir as injúrias que ainda sequer foram inventadas pela cisnormatividade. Queremos com este labor, por outro lado, desmentir também. Será preciso desapegar-se da arte e da sexualidade, tais quais concebidas como áreas, para suportar dispositivos de gênero pensados pela marginalidade. Da espessura densa que tem os centros das estéticas clássicas ou das sexualidades intimistas, esta tessitura complexa e arredondada que chamamos agora de livro-lugar se opõe ao privado mostrando em tom de ruptura e de fronteira as lindezas dos saberes e afetos públicos das periferias do social. Xs organizadorxs.