Bruno Cunha começa a examinar a articulação entre moralidade e o problema do mal desde o de sua aparição primeira na obra de Kant, quando, ainda na década de 1750, ele se deparou com a teodiceia leibniziana. A originalidade de sua reconstrução reside na hipótese de que a cogitação de Kant sobre esse problema foi determinante na orientação de sua inteira filosofia prática. A ruptura com a tradição leibniziano-wolffiana, entre os anos 50 e 60, a aproximação de Kant em relação aos britânicos e especialmente, a Rousseau, são rediscutidos através desse problema, em uma investigação que combina a análise dos textos publicados com a interpretação das Reflexionen e das anotações ao compêndio de filosofia prática de Baumgarten. Ao fim e ao cabo, o leitor se dá conta que a articulação entre a fundamentação da obrigação, de um lado, e a aferição de um sentido para a ação moral, de outro, foi sendo gestada logo que a solução de matiz intelectualista e teológica oferecida pelo wolffianismo se revelou insustentável. A análise aqui efetuada das Reflexionen kantianas da segunda metade dos anos 60 é decisiva para reaver todo interessante e alcance das respostas ulteriores. Bruno Cunha é especialmente feliz em assinalar a lenta conversão de uma teodiceia objetiva – ponto de vista de Leibniz e Wolff – para o que será, com a consolidação do criticismo, uma filosofia da história. É impossível não recordar aqui um célebre artigo de G. Lebrun, no qual ele chamava a atenção para o fato de que a filosofia da história opera no kantismo como uma escatologia para o homem moral."
Vinícius de Figueiredo.