Amparado por uma minuciosa pesquisa em acervos nacionais e estrangeiros, que incluiu documentos públicos e pessoais, diários, jornais, correspondências, gravações e filmes do período, Lira Neto mostra como e por quê, para bem ou para mal, Getúlio Vargas foi “a maior figura política do Brasil no século XX”, na expressão do historiador Boris Fausto.
Logo depois da conquista do poder federal, em outubro de 1930, Getúlio se viu diante do complexo desafio de promover sua ambiciosa agenda de reformas ao mesmo tempo em que precisava neutralizar, como um jogador de xadrez paciente, os movimentos da oposição interna e externa ao regime. Diversas facções políticas insatisfeitas, especialmente os “reacionários” de São Paulo, insistiam em questionar a autoridade do todo-poderoso líder gaúcho.
Com a Constituinte de 1934 - concessão provisória às aparências democráticas - e a recondução por eleição indireta ao Catete, Getúlio na realidade consolidou sua supremacia pessoal sobre as frágeis instituições políticas do país. O presidente forjava com sua figura roliça e bonachona, sempre de charuto e vestido em ternos de linho de impecável apuro, a imagem impoluta de “pai dos pobres”. À maneira de um monarca absoluto dos novos tempos, era a própria encarnação do Poder, difundida massivamente em palavras e imagens pela publicidade oficial.
Após o breve interlúdio democrático, o golpe do Estado Novo em 1937 reinstituiu a ditadura aberta, inspirada no salazarismo e no fascismo italiano. A guinada autoritária, justificada pela necessidade de esmagar a subversão comunista, teve o respaldo da hierarquia militar e da poderosa Ação Integralista Brasileira, de extrema-direita. O experiente caudilho, no entanto, optou por prescindir da organização de massas que em última análise fragilizaria sua autoridade pessoal, e baniu todas as agremiações políticas, inclusive a AIB. A frustrada vingança integralista, com o assalto ao Palácio Guanabara em maio do ano seguinte, deu ensejo a mais repressão política, dirigida pelo sinistro chefe de polícia do Distrito Federal, Filinto Müller.
No plano externo, a eclosão da Segunda Guerra Mundial marcou a reaproximação de Getúlio com as potências aliadas e, internamente, a decadência do regime estadonovista. Mas a contradição de lutar pela democracia na Europa e exercer o poder ditatorial no Brasil acabaria minando a sustentação de Getúlio nos quartéis. Em novembro de 1945, o general Góes Monteiro, seu antigo colaborador, liderou a rebelião militar que encerrou os primeiros quinze anos de Getúlio no Palácio do Catete.