O grau de emoção ou tédio do seu emprego vai depender do quão inusitada é a sua rotina profissional, e não necessariamente do humor de seu chefe ou do que disse um consultor de carreira. Apertar parafusos das oito às cinco - seja num chão de fábrica escaldante ou num escritório refrigerado - certamente não apresenta um cenário animador. Já testar sapatos de luxo caminhando por aí pode trazer perspectivas para lá de promissoras. Que o diga Wilhelm Genazino, um desses autores que há tempo já deveria ter chegado ao Brasil. Ganhador de vários prêmios - entre eles o mais importante da Alemanha, o prêmio Büchner, recebido pelo conjunto de sua obra -, Genazino é o filósofo do marasmo contemporâneo, o passeador solitário dos dias melancólicos da cidade moderna, o ensaísta cheio de histórias do século. Aqui, seu narrador de meia-idade trabalha como testador de sapatos de luxo na metrópole alemã dos negócios. No dia a dia cimentado de Frankfurt, em que todo detalhe é um símbolo de sua aguda imaginação, este protagonista anônimo redige seus relatórios sobre os diversos tipos de calçados e, na melhor tradição de um flâneur, conduz o leitor por uma prosa vagueante que faz rir e pensar. Para as mulheres ele julga jamais ser bom o bastante; da vida ele suspeita não ter recebido qualquer autorização; sobre a realidade ele cultiva apenas um entendimento parcial. Ao contar o seu destino e o de outros sujeitos com seus atos aparentemente mundanos, Genazino faz do profundo espanto que é perambular neste mundo uma marca de estilo, e oferece uma das mais inventivas metáforas da existência do homem contemporâneo. Escrito com humor exemplar, Um guarda-chuva para o dia de hoje toca questões decisivas da atualidade, especialmente quando o cotidiano nos parece tão estranho e qualquer fiapo de conexão com a humanidade tão excepcional.