Este livro examina, a partir de um momento crítico como o atual, outro momento convulsivo, o das revoluções liberais e das independências no mundo ibero-americano, e faz isso a partir de uma perspectiva inusitada. A abordagem histórico-conceitual aqui adotada dá atenção muito especial às mudanças nos vocabulários utilizados pelos atores da época e às drásticas transformações na consciência histórica e temporal experimentadas naquelas décadas decisivas que deram origem a um novo cenário político construído sobre as ruínas dos impérios atlânticos.
Além de analisar aspectos cruciais das modernidades ibéricas, como as mudanças nos conceitos, mitos, metáforas e imaginários, bem como nas percepções do tempo histórico por parte dos agentes dos séculos XVIII e XIX, o autor lança um novo olhar sobre alguns aspectos teóricos-metodológicos de grande interesse. Para que serve a história? É possível recuperar os significados móveis e controversos do passado? Como abordar a complexa dialética tradição-modernidade e as quebras na consciência histórica? Num mundo hiperacelerado como o nosso, quando cresce o interesse pela história e o tempo mais uma vez parece fora dos eixos, é oportuno procurar respostas para estas e outras perguntas que cidadãos e historiadores responsáveis terão de enfrentar nos tempos difíceis que se avizinham.
Este excepcional livro de Javier Fernández Sebastián, História conceitual no Atlântico ibérico. Linguagens, tempos, revoluções, é uma referência fundamental para todos os interessados não só na história das sociedades ibero-americanas ou em história conceitual, mas em pensar a história, os dilemas e desafios que se colocam para sua escrita. Tendo como fios condutores a linguagem, o tempo e as revoluções, o autor enfrenta o desafio de pensar a transição das sociedades ibero-americanas para a modernidade, entre finais do século XVIII e o último terço do século XIX, na perspectiva da história conceitual.
Para isso, analisa um expressivo conjunto de conceitos, linguagens, metáforas, mitos e imaginários utilizados por agentes históricos nesse período que demonstram o complexo processo de transformações vividas, marcado por deslocamentos, rupturas e continuidades semânticas que conforma uma profunda reconfiguração da linguagem e das concepções de tempo, e que proveem grande parte do material que anima as revoluções.
No momento atual em que assistimos a um cada vez maior e mais perigoso uso seletivo do passado com fins políticos, Javier Fernández Sebastián nos lembra em seu livro que uma das principais virtudes da história conceitual está na sua capacidade de recuperar experiências a partir de significados, de evitar a retrospecção presentista, carregada de anacronismos que obscurecem a alteridade do passado em toda a sua pluralidade. Com a história conceitual tal qual ela é concebida e elaborada pelo autor, tornamo-nos mais conscientes da historicidade do mundo em que vivemos e da contingência e precariedade dos meios para apreendê-lo.
Maria Elisa Noronha de Sá — Professora da PUC-Rio