O fluxo da narrativa nos leva, num só fôlego, a acompanhar a odisseia de ideias do narrador – um verdadeiro Ulisses contemporâneo, preso no labirinto de um meio-dia, ou meia-noite, em que a solidão e a memória se revelam e se dissolvem na difusa identidade de um “ninguém” que carrega (como todo herói trágico) um pouco de todos nós. A ficção apocalíptica deste Informe tem uma fluência quase hipnótica, em que as tintas de modulações inesperadas prendem a atenção do leitor, como naquelas composições que trazem novos sentidos e descobertas a cada página e a cada nova leitura. Segundo João Almino, “[…] Nessa ficção não há saída, e nada faz sentido. Salvam-se as memórias de infância, as árvores, os figos comprados por ‘ela’ e os elementos essenciais como o ar, a água e a terra. O enredo sutil, apenas insinuado, é marcado, como um leitmotiv, pelos ponteiros do relógio, que se superpõem ao meio-dia ou à meia-noite, sob o céu azul ou na escuridão, numa repetição diária de vidas. Nesta prosa poética, fluxo do inconsciente ou da conscientização, existe também uma reflexão sobre a própria escrita, que se constrói por associações livres, porém bem concatenadas. Informe, com seus três possíveis sentidos, percorre as atribulações reais ou imaginárias de um narrador em dissolução na sua persistente, compulsiva e inadiável tentativa, sempre frustrada, de saber se é ‘alguém’ ou ‘ninguém’.”