Duas irmãs sobrevivem a uma explosão e são entregues por militares aos cuidados de uma prostituta. Com a memória afetada pelo traumático episódio em que seus pais morreram, as garotas contam apenas uma com a outra para se adaptar e sobreviver a um cotidiano marcado pela violência. Indefesas, elas sofrem físicamente e moralmente. Esse é ponto de partida do romance 'As lágrimas de Alá', em que o escritor francês Patrice de Méritens relata a inocência ultrajada em nome da guerra. O autor amarra a trama sob o ponto de vista do mais fraco: a criança órfã do sexo feminino; num mundo em que as armas, a fé e o poder são monopólio masculino. O romance acompanha a trajetória de duas garotas sem nome num país não identificado do Oriente Médio. Pouco se sabe também sobre seu passado, e o livro deixa claro que elas não terão futuro: sozinhas no mundo, experimentam a chegada da adolescência enquanto são transformadas em sahidate, mártires encarregadas de eliminar "infiéis" em atentados suicidas. Conduzido pela voz das protagonistas, o leitor adentra uma atmosfera tão brutal quanto onírica. A linguagem ingênua de criança revela as crueldades mais ultrajantes, denunciando o que pode acontecer quando a barbárie se instala na vida cotidiana. Com sua hábil exploração dos paradoxos, Méritens, jornalista do Le Figar que viveu no Iraque, transita entre a brutalidade e a inocência, entre o poético e o atroz, para reconstituir uma trajetória de perdas - cujo final surpreendente confere novo significado a toda a história.