Amilton tem grande admiração por Nietzsche, mas seu discurso crítico sobre o Direito lembra mais W. R. Wagner: há um quê de música e de poesia nos seus textos, para além da potente retórica desconstrutiva. Em suas palestras, ouvimos uma fala cantada e invariavelmente sedutora. Trata-se de virtudes bastantes incomuns numa cena a do mundo jurídico em que as expressões beiram ao estéril.
Nessa obra, nos é apresentado o único propósito altruísta para a Lei (não a da psicanálise, ele ressalta): numa sociedade em que sempre haverá diferenças e assimetrias nas condições materiais, afetivas e intelectuais dos seres humanos, a Lei serve principalmente para a defesa do mais débil. Os pragmáticos profissionais da área jurídica poderão eventualmente aproveitar o capítulo referente à Tópica.
Esboça-se ainda a trajetória do Movimento de Direito Alternativo, acrescida de interpretações sobre o que significa essa expressão, e são enaltecidas as grandezas da Defensoria Pública e da Advocacia criminal com as quase sempre presentes críticas ácidas ao modo de pensar dos juízes criminais e a determinadas práticas forenses, que costumam sair exasperadas do seu teclado (melhor não dizer que as palavras emanam da tinta da pena, porque dessa Amilton sempre foi seu maior crítico).
Num ambiente em que os autores das obras geralmente se limitam a explicitar interpretações um tanto óbvias sobre leis e decisões judiciais, Amilton, uma vez mais, nos apresenta um conteúdo que pode ser chamado de pensamento, o que instaura uma dúvida: chamá-lo-emos de amiltiniano ou carvalhiano? Poucos homens, ao longo da história, foram dignos dessa dúvida - afinal, os pensadores costumam ser conhecidos só pelo sobrenome, mas não os amigos.
Márcio Augusto Paixão advogado criminalista