Este livro irradia (na esteira de Novalis) a certeza de que poesia e filosofia não se estranham. Que o real é absolutamente verdadeiro porque é poesia e, para o caso, é lirismo de paixão, que transborda por todos os poros, à flor da escrita. Aqui, o amor é o fim último da história do universo que uma pessoa é, a bênção estelar que se exerce no corpo, este, o templo mais sagrado e sublime, a morada, o solar onde a amada aguarda o amado para tocar os céus.Sua autora, doutora em filosofia, pesquisadora de mão-cheia, opera nesta obra a desoras, como poetisa entre a vigília e o sono, na esfera do puro devaneio, banhada pela luz do provisório e do incerto (peleja entre trevas e luz), na garantia de uma realidade tão absoluta que se torna surreal. A palavra, indecisa entre os seus múltiplos enlaces, revela, nessa ação, a delicada contingência, abrindo-se para os grandes enigmas do lusco-fusco, do intermédio, nesse regime de exceção que o princípio de prazer faz vigorar. Coisa de mulher, acima de tudo, estes poemas evocam uma tresnoitada Mariana Alcoforado, assim como também a Amiga do cancioneiro medieval galaico-português, cuja alba ou alva é a aurora em que este Livro da Madrugada acorda: a despedida do inesperado visitante, a sua partida para o retorno aguardado, o afastamento para o pronto regresso... pelo corredor incomensurável do tempo! Aquilo que o sonho gesta e os impulsos incontroláveis das sensações ditam como escrita ou canto solitário (e incluam-se aí medos, passagens secretas, mistérios, compartilhamentos) é a matéria de que esta obra se nutre. Estrelas no alto, conturbado o coração.E é no centro desta poética que nasce uma árvore. Seus galhos são pontes, ligações perigosas, pontas do amor que trançam uma rede (um poema a outro se remete) irrigando os vasos comunicantes: galhos frondosos que se enroscam na pele (nesta se enredando), num corpo que é enervações de planta (canais abertos), espraiando por tudo a sua floração, os seus perfumes, as suas raízes, a sua música