Esta edição de 'Macário' e 'Noite na taverna', de Álvares de Azevedo, com organização, notas e posfácio de Cilaine Alves Cunha, pretende ser um marco entre as edições dessas obras. Para tal, a organizadora se utilizou da edição princeps (1855), cotejando-a com a de Homero Pires das Obras completas de Álvares de Azevedo, de 1942, vindo a estabelecer um texto mais próximo da lição original, que em geral havia se perdido nas edições de vulgarização. O extenso e precioso aparato de notas desdobra as referências onomásticas e bibliográficas dos textos, fornece esclarecimentos lingüísticos, além de indicar diferenças entre as edições utilizadas. A reunião dos dois textos não é arbitrária. Seguindo a hipótese formulada por Antonio Candido, a organizadora retoma as relações entrevistas entre eles e que justificam sua aproximação. A rigor, se 'Noite na taverna' é a continuação de 'Macário', ainda seria possível imaginar uma terceira parte, que parece não ter sido escrita, em que se concluísse o processo de formação do protagonista. 'Macário' é um drama com três personagens centrais: Macário, Penseroso e Satã. Macário, esse "Fausto brasileiro", personagem que sintetiza, a um só tempo, a pureza utópica e a falta de ilusão, é conduzido por Satã, que pretende iniciá-lo nos aspectos mais soturnos da vida, cético quanto à civilização e ao progresso, numa espécie de aprendizagem ao contrário. Penseroso é o inverso de Satã, encarnando o sentimento da pátria, o racionalismo e o otimismo em relação ao futuro. Sua morte, nesse sentido, pode talvez ser lida como índice de crítica de Álvares de Azevedo à pauta indianista da primeira geração romântica brasileira (não por acaso, os enredos dos dois textos aqui editados se passam na Europa). E a conclusão de Macário parece efetivamente remeter à Noite na taverna, quando Satã diz para o protagonista olhar por uma janela uma orgia com cinco homens numa sala enfumaçada e pede que ele ouça o que estão dizendo.