«Unum necessarium est» (Lc 10, 42). Na introdução da sua já clássica obra As três idades da vida interior, o Pe. Garrigou Lagrange recorda aquele diálogo de Jesus com as duas irmãs em Betânia, Maria e Marta. Esta última, em meio às diversas ocupações, inquietava-se por ver sua irmã imóvel, sentada aos pés do Senhor. Esta foi a ocasião propícia que Jesus encontrou para ensinar-nos que, em meio a tantas ocupações que nos solicitam, uma só coisa é necessária. Entre as diversas atividades que exigem nossa atenção – sejam elas no campo do trabalho, da cultura, da vida familiar, ou de outros tantos âmbitos que integram as atividades do homem na terra –, não podemos perder de vista que a única coisa realmente necessária é escutar a palavra de Deus e colocá-la em prática. A palavra que se fez homem, para ensinar ao homem quem ele é.
Urge em um tempo como o nosso, onde parece não haver mais lugar para Deus, redescobrir este «unicum necessarium», a única coisa que realmente importa, e, a partir da qual, todas as demais encontram o seu verdadeiro valor. A vida espiritual não é apenas uma das dimensões que compõe a existência humana, mas a sua principal, a que preenche de sentido todas as outras, dando-lhes seu autêntico relevo.
O presente livro, cujo autor é, sem sombra de dúvida, uma das mais importantes referências da teologia espiritual do século XX, traz uma faceta sua pouco conhecida: a de biógrafo. Escrevendo sobre uma das suas eminentes filhas espirituais, a brasileira Madre Francisca de Jesus, o Pe. Lagrange nos permite perceber que a vida espiritual não é mero objeto de especulação teórica, mas caminho possível de ser seguido por todos aqueles que descobriram que, já dizia Santo Tomás de Aquino, «só Deus sacia».
A vida de Madre Francisca, assim como a de incontáveis homens e mulheres que viveram em profundidade a amizade com Deus, é para nós um estímulo a buscar o primado da vida interior, a melhor parte, a única que não nos será tirada! Padre Demétrio Gomes da Silva