Verifica-se, cada vez mais, um crescente interesse pela mística no Brasil, evidenciado pelo número cada vez maior de publicações sobre suas diversas manifestações históricas, tradicionais e modernas. Nas últimas décadas, Faustino Teixeira tem se destacado como o maior responsável pelo duplo estímulo de nos conduzir ao retorno às fontes e à extensão de sua atualidade, organizando eventos, publicando livros e promovendo discussões interdisciplinares entre estudiosos diversos. Por isso mesmo, a obra que tem produzido é marcada por um vigoroso compromisso com a abertura da espiritualidade ao mundo e o cruzamento dialogal da mística cristã com outras tradições. Em todos os artigos deste livro, prenhes da paixão do buscador, do rigor do pesquisador e dos insights comparatistas de uma erudição que atravessa as fronteiras da mística árabe e zen budista, o leitor vai deparar-se com a clareza expositiva de diferentes itinerários espirituais. Por mais diversos que sejam, todos eles se deparam com a luta ascética contra o mal, a distração, o egoísmo, o necessário reconhecimento da finitude e da morte e o aprofundamento de uma purificação contemplativa e solitária, de modo a conquistar a liberdade do desapego. Contudo o esforço teórico de Faustino é de insistir no fato de que, por mais que autoridades eclesiais teimem em isolar a Igreja, nos maiores nomes da mística cristã (Eckhart, Teresa, João da Cruz, Silesius), bem como nos seus renovadores modernos (Teilhard e Merton), abundam exemplos de que depois do recolhimento o místico deve retornar ao mundo, produzir obras e educar o seu olhar com vistas à percepção das delicadezas e grandezas do cosmo material. Descobrir o encanto da singela poesia das coisas é a chegada de um longo percurso. Interiorização e exteriorização, Maria e Marta, iluminação e cotidiano, tribulações e alegrias não são nada excludentes. A religação de tais extremos serve para revelar a dádiva da vida e enfrentar qualquer dificuldade com um otimismo entusiasmado e nada ingênuo. A ascese do desprendimento, depois de descartar dependências e vícios, vai recuperar redobradamente o que havia renunciado, não num prometido além, mas na eternidade do instante.