O livro de Malu Stanchi traz uma contribuição decisiva, ao tomar a escravidão como o primeiro laboratório da tortura no Brasil. Através do diálogo com sujeitos históricos que produziram narrativas abolicionistas, a autora reposiciona de forma crítica e informada por uma metodologia decolonial os gritos de Lauriana, Anna das Dores, Guilherme, João Barcelos e de todas(os) que com elas(es) compartilharam os mesmos suplícios. Seguindo a trilha da categoria político-cultural da amefricanidade, será através da resistência ao escravismo, aqui materializadas pelos periódicos abolicionistas do séc. XIX, que Malu Stanchi irá demonstrar a relação intrínseca entre Direito, escravidão e tortura.
O percurso busca posicionar tais registros como estruturais e estruturantes da violência sistemática contra pessoas negras sobre a qual se ergueu o sistema de (in)justiça brasileiro. Um exercício que nos permite entender o seu funcionamento no século XIX e impulsionar estratégias de denúncia, prevenção e combate às torturas contemporâneas. Èsù matou um pássaro ontem, com uma pedra que jogou hoje. Este é um livro que atinge hoje os órgãos do sistema de (in)justiça pela cumplicidade com o genocídio negro, com as pedras atiradas ontem nos escravizados do século XIX.
Thula Pires