Quem controla o passado controla o futuro; quem controla o presente Cazumba controla o passado”, escrevia há 72 anos George Orwell em sua clássica distopia 1984. O poder do passado sobre o presente e sua capacidade de reafirmá-lo motivou instituições em geral, estados e partidos em todo o mundo e ao longo do tempo, a pretender domesticar a história e o processo de construção de sua narrativa. Mitos e mitologias da participação militar brasileira no Haiti apresenta, de forma instigante, como as instituições militares empreenderam um esforço em dominar a narrativa sobre suas próprias experiências desde os momentos iniciais da participação brasileira na Minustah. No contexto dessa elaboração, desenvolveu-se o mito do “jeito brasileiro de fazer Operações de Paz”, uma reedição requentada das ideias de Gilberto Freire e do incompreendido homem cordial de Sérgio Buarque de Holanda. Parcela da intelectualidade, dedicada ao tema, aderiu a essa narrativa e ignorou as contradições existentes entre a Doutrina de Coordenação Civil da ONU (Cimic) e as práticas operacionais dos militares brasileiros, aspectos estampados nos diversos registros documentais do período, inclusive nos produzidos pelos próprios militares. A obra em questão lança um olhar objetivo e compromissado com o método científico sobre essa participação, convidando o leitor a compreender as bases da construção de uma Mitologia Moderna sobre a experiência militar no Haiti e os limites que impuseram uma verdadeira barreira à compreensão da Doutrina de Cimic da ONU por parte de nossos militares.