A grande contribuição deste livro é a de percorrer a noção do estatuto do corpo, dando a este uma positividade frente às noções de normalidade e saúde. A singularidade, antes ancorada exclusivamente em valores subjetivos, passou a ser marcada no corpo seja sob a forma de tatuagens ou como body-art. Fernando Pontes Soares nos mostra o quanto é simplista qualificar esses eventos como anormais ou doentes. Lançando mão de autores como Nietzsche, Canguilhem e Foucault, o autor aponta para a fragilidade das premissas de saúde e normalidade que tentaram delimitar esse campo, e para o quanto essas categorias precisam ser repensadas sob outras óticas. Lança mão do saber psicanalítico, trazendo à luz o conceito de saúde em Winnicott. Além disso, equipado com as noções winnicottianas de criatividade e espontaneidade, o autor vai redescrever a relação entre mudança corporal e estados físico-mentais de saúde e doença de forma extremamente interessante. O corpo, à luz dos dois conceitos, ganha um protagonismo teórico e psicológico que parecia pouco visível nas demais teorias psicanalíticas. Do ponto de vista psicológico, divergir do meio ambiente pode ser sinal de saúde e de força de vida. O que distingue uma atipia inovadora de uma mera manifestação sintomática é a capacidade que a primeira tem de renovar continuamente a pluralidade dos espaços transicionais. Com isso, a clareira da criatividade e da espontaneidade permanecerá aberta a todos os corpos, desejos, crenças e atitudes que façam com que “a vida valha a pena ser vivida”. Este livro propõe inúmeras indagações que povoam a clínica atual.