Esta obra é tão próxima do fim inevitável quanto da vida em seu estado de abundância: cisnes, raposas, serpentes, gatos, pombas, e até porcos mágicos. Os bichos fazem festa em assombrosas aparições, e Eros e Thanatos se personificam em seres e/ou situações para percorrerem seus fluxos naturalmente através dos bosques e parques ambientados nos poemas. “Beija-flor me chamou porque morria / e meus dedos rudes entendem de enterro.” Sempre em escape, em rota de fuga, os animais transitam como parte de um cortejo fúnebre, sobretudo em “Dos bichos”, a primeira parte do livro. A segunda parte, “Da morte”, não trata da procura incessante pela mesma, e sim do reconhecimento de sua irredutibilidade, e justo por isso de outros modos de ater-se à vida. As operações geram um mosaico de imagens ousadas: o ouroboros apresentado no poema “Cosmogonia”, “você se reconhece no berço,/ as escamas da cobra/ subindo/ como escadas até o começo.” E outros explícitos apelos de eternidade, como a figura da trisavó que resiste ao tempo, “a inigualável senhora Simone”. Na terceira parte, “Das coisas”, um certo animismo toma conta dos versos. A experiência sensorial se maximiza para a anunciação de um pequeno esplendor. “às vezes é preciso ver através,/ às vezes é preciso ver apenas/ o que se apresenta ao alcance dos dedos.” Por fim, na última parte, “de nós”, a ternura predomina no encerramento. Pai, mãe, filho, marido, jardins, amigos, o amor gritando com seu cavalo… as relações humanas revelam-se inteiras, como uma belíssima retribuição.