Noites tranquilas em Belém – às vezes, não tão tranquilas como se imagina – é um livro multifacetado em que as culturas brasileira e francesa se mesclam num jogo de complementaridade. Optando por um “sim”, a vida do narrador se transforma do dia para a noite, e um quebra-cabeça começa a ser tecido com as peças que lhe são fornecidas pouco a pouco. Trata-se da busca da própria identidade e tudo o que se constrói a partir dela: amores, memórias, projetos…( pessoais ou de um outro). O tempo torna-se uma sucessão de “outroras” imprecisos, misturando-se a um presente, também, fluido; o espaço, por sua vez, é uma dança entre Goa e sua casa amarela, Versalhes, Digne e Belém. Guiado pelas mãos ingênuas e a inocente malícia de uma criança, percorre as ruas, mercados e favelas de Belém, descobrindo seu lugar nessa história. Longe de Versalhes – onde o geógrafo de Luís XIV, Blaise de Pagan, tentava manter seus aposentos – e de sua Digne natal, seu destino dá uma guinada. E como não ressaltar a força das personagens femininas – em certas ocasiões, mais hábeis no manejo de um revólver que os homens –, privilegiadas por poderem cantar as Excelências ou Incelências nos rituais fúnebres? Gilles Lapouge tem a habilidade de materializar sensações através de cores, descrições, pitadas de humor e jogos de palavras. Seus personagens carregam as imperfeições humanas, mas também têm grande dose de sensibilidade e poesia. Todo esse contexto é favorável a que projetemos já uma continuação dessa aventura pelo Brasil, país tão caro ao autor, e que ele bem conhece por ter vivido nele por vários anos.