Uma poética das pequenas coisas que encanta com a transparência de suas imagens: a brancura do amanhecer, uma paisagem nevada, os viajantes, um barco sem vela. As composições poéticas de um dos mestres do cinema mundial, confirmam o seu extraordinário talento para fixar momentos de sugestão. A imagem que define a ambição poética de Kiarostami advém de um ditado persa: «Tinha dois olhos e pediu mais dois emprestados». Usada como referência para momentos em que se deseja olhar para algo com uma intensidade mais detida, a ideia condensa justamente o que o próprio poeta estabelece como um desejo a ser alcançado. O ato de tomar olhos emprestados e assim poder aguçar a percepção, fazendo com que ela recuse a rapidez e a superficialidade daquilo que se vê, é o que transpassa por toda a sua obra - cinematográfica, fotográfica e também poética.
Os poemas, chamados pelo próprio Kiarostami de «haikus», pela proximidade formal ao verso japonês, mantêm uma relação íntima com o universo cinematográfico do poeta. O resultado é o de que seus «haikus» muitas vezes nos solicitam, interrogando-nos tanto quanto podemos nós mesmos interrogá-los. A marca definitiva da poesia de Kiarostami é o fato de não podermos, em definitivo, prostrarmo-nos diante dela, de maneira descomprometida. Ela nos movimenta, evocando a urgência de que sejamos ativos diante daquilo que ela nos propõe.