Saindo do seu mundo, enxergando o outro, você consegue ver que as pessoas neuroatípicas são alguém dotado de sentimentos, pensamentos e desejos? Esse é um dos pontos que Ernane Alves discute, ao colocar em vitrine, neste livro, a sexualidade de indivíduos que muitas vezes não são vistos na sociedade, menos ainda como pessoas que têm desejos, sentem tesão, fazem sexo e sentem prazer, como eu, você e boa parte do mundo. Volte à escola. Consegue ver algum colega alvo de bullying, que não se encaixava em lugar nenhum e a quem a maioria discriminava? Esse menino ou essa menina, desconfortável e sem acolhimento no ambiente escolar, era um Ernane. Nem toda criança ou adolescente teve a sorte ou a oportunidade de, ao longo da trajetória, ressignificar a própria condição e transformar o trauma em luta, para si e para a comunidade neuroatípica. Ernane teve. E, hoje, mesmo que lhe custe expor a intimidade ou revisitar passagens dolorosas da vida, ele consegue agir e produzir — arte, livro, filme, fala, o que for — para pavimentar um futuro, não longínquo, em que um indivíduo neuroatípico, em especial o autista, não seja alvo de humilhações, incompreensões e excessos. Para que esse indivíduo encontre, no ambiente escolar e em outro qualquer, uma mão generosa, como a da desconhecida que salvou o autor deste livro num dia de mergulho profundo na dor.